Canção
A pastorinha morreu, todos estão a chorar. Ninguem a conhecia
e todos estão a chorar.
A pastorinha morreu, morreu de seus amôres. Á beira do rio
nasceu uma arvore e os braços da arvore abriram-se em cruz.
As suas mãos compridas já não acenam de alêm. Morreu a
pastorinha e levou as mãos compridas.
Os seus olhos a rirem já não troçam de ninguem. Morreu a
pastorinha e os seus olhos a rirem.
Morreu a pastorinha, está sem guia o rebanho. E o rebanho
sem guia é o enterro da pastorinha.
Onde estão os seus amôres? Ha prendas para Lhe dar. Ninguem
sabe se é Elle e ha prendas para Lhe dar.
Na outra margem do rio deu á praia uma santa que vinha das
bandas do mar. Vestida de pastora p'ra se não fazer notar. De dia era uma
santa, à noite era o luar.
A pastorinha em vida era uma linda pastorinha; a pastorinha
mórta é a Senhora dos Milagres.
Almada Negreiros, in 'Frisos - Revista Orpheu nº1'
1893/1970
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