sexta-feira, 11 de janeiro de 2019







Acordar Tarde

Tocas as flores murchas que alguém te ofereceu
quando o rio parou de correr e a noite
foi tão luminosa quanto a mota que falhou
a curva - e o serviço postal não funcionou
no dia seguinte

procuras ávido aquilo que o mar não devorou
e passas a língua na cola dos selos lambidos
por assassinos - e a tua mão segurando a faca
cujo gume possui a fatalidade do sangue contaminado
dos amantes ocasionais - nada a fazer

irás sozinho vida dentro
os braços estendidos como se entrasses na água
o corpo num arco de pedra tenso simulando
a casa
onde me abrigo do mortal brilho do meio-dia


Al Berto, poeta e editor português (1948-1997).




Foto: https://www.pinterest.pt/cinafraga/


quarta-feira, 9 de janeiro de 2019







Canção Báquica


Que fez calar a alegre voz?
Ressoai, canções licenciosas!
Bem-vindas, moças carinhosas
E esposas tão jovens que amáveis a nós!
As taças enchei sem tardança!
No vinho a espumar,
No fundo, o jogar
Vinde (e ouvi-las soar) cada aliança!
Cada taça se erga, de vez seja finda!
Bem-vindas, ó musas; Razão, sê bem-vinda!
Astro sagrado, arde tu, sol!
Como o lampião empalidece
Ao claro surgir do arrebol,
Assim o saber falso hesita e esvanece
Ante o imortal sol da Razão.
Bem-vindo sê tu, sol; vai-te negridão!



Aleksander Púchkin   Poeta e dramaturgo  1799–1837
(1825)




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