domingo, 25 de outubro de 2020


 

 

 

Sou

 

 Sou suave e triste se idolatro, posso

Abaixar o céu até minha mão quando

A alma do outro à alma minha enredo.

Pena alguma não acharás mais branda.

Nenhuma como eu as mãos beija,

Nem se acomoda tanto em um sonho,

Nem convém outro corpo, assim pequeno,

Uma alma humana de maior ternura.

Morro sobre os olhos, se os sinto

Como pássaros vivos, um momento

Voar baixo meus dedos brancos.

Sei a frase que encanta e que compreende,

Sei calar quando a lua ascende

Enorme e vermelha sobre os barrancos.

 

 

Alfonsina Storni, poetisa argentina (1892-1938).


quarta-feira, 29 de julho de 2020



Noite estrelada

O céu - brilhando - se abaixa
Silenciosamente



Eunice Arruda


sexta-feira, 17 de julho de 2020





IV - Noiva 



Noiva... minha talvez... pode bem ser que o sejas.
Não me disseste ao certo o dia em que voltavas.
O céu é claro como o teto das igrejas:
Vens de lá com certeza. Humildes como escravas,

Curvadas ainda estão as estrelas morosas;
E bem se vê que algum excelso vulto branco
Passou por elas, entre arcarias de rosas,
Revolto o manto de ouro, afagando-lhe o flanco.

Há tanto tempo que te espero, e espero embalde...
Não sabia que assim tão diferente vinhas.
Tinhas negro o cabelo: entanto a nuvem jalde,
Que o doura todo, o faz tão outro do que tinhas!

Quando morreste, o sol era morto, e ainda agora
Para mim se prolonga essa noite de guerra...
Acaso vens com o teu olhar de eterna aurora
Aclará-la outra vez, vindo de novo à terra?

Vejo-te a imagem tão destacada no fundo
Deste meu sonho, que é como se eu não sonhasse...
Cheio da nostalgia estelar de outro mundo,
Tem as mágoas de um astro o palor da tua face.

Caminhas, e os teus pés sublimes nem de leve
Tocam a flor do solo: o ar impalpável pisas.
Ora se abaixa, ou se ergue o teu corpo de neve...
Parece que te vão berçando auras e brisas.

O peristilo arcual da tua boa se move:
Soabre-se: a fulva luz que a ilumina contemplo...
Falas: como me pasma e inebria e comove
Toda a púrpura real do interior desse templo!

Parece que um hinal de suaves litanias
Acompanha a tua voz nas palavras que soltas.
Não sabia que assim tão outra voltarias:
Eras de negro olhar, de olhar azul tu voltas.

Que me admira se vens de olhar azul e louro
Cabelo? Não é a mesma a tua formosura?
Voltas do céu, e a cor celestial é azul e é ouro,
E é todo este clarão que a imagem te moldura.

Noiva... minha talvez... e por que não? Setembro
Volta. Setembro é o mês das laranjeiras castas.
Vens de grinalda branca, a voar... Ah! bem me lembro.
A veste com que foste é a mesma que hoje arrastas.

Foste de branco e vens de branco ainda trajada.
A túnica nupcial que em níveas dobras desce
Pelo teu corpo, tem a brancura sagrada
Dos alvos corporais do altar exposto à prece.

O parélio do gênio imortal que te anima
Surge no resplandor que te aureola a cabeça.
Atenta escutas os meus versos rima a rima,
E mandas que em cada um a tua Alma apareça.

Quero abraçar-te e nada abraço... O que me assombra
É que te vejo e não te encontro com os meus braços.
Morta, beijei-te um dia: hoje tu és uma sombra
Exilada do céu para seguir-me os passos.




Alphonsus de Guimaraens, poeta brasileiro (1870-1921).



quinta-feira, 16 de julho de 2020


Original oil painting on aluminium panel 60 x 74,5x0,4cm," by Elena Kraft.







terça-feira, 14 de julho de 2020







E aqueles que foram vistos dançando foram julgados insanos 
por aqueles que não podiam escutar a música


Friedrich Nietzsche


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Foto: Gillian Murphy. Principal dancer, American Ballet Theatre

terça-feira, 26 de maio de 2020






Eu amei-te; mesmo agora devo confessar,
Algumas brasas desse amor estão ainda a arder;
Mas não deixes que isso te faça sofrer,
Não quero que nada te possa inquietar.
O meu amor por ti era um amor desesperado,
Tímido, por vezes, e ciumento por fim.
Tão terna, tão sinceramente te amei,
Que peço a Deus que outro te ame assim.




Alejandro Pushkin, 

Poeta romântico russo. (1799-1837)