domingo, 29 de outubro de 2017





ESCULTURA

Eu já te amava pelas fotografias.
Pelo teu ar triste e decadente dos vencidos,
Pelo teu olhar vago e incerto
Como o dos que não pararam no riso e na
alegria.
Te amava por todos os teus complexos de
derrota,
Pelo teu jeito contrastando com a glória dos
 atletas
E até pela indecisão dos teus gestos sem
pressa.
Te falei um dia fora da fotografia
Te amei com a mesma ternura
Que há num carinho rodeado de silêncio
E não sentiste quantas vezes
Minhas mãos usaram meu pensamento,
Afagando teus cabelos num êxtase imenso.
E assim te amo, vendo em tua forma e teu olhar
Toda uma existência trabalhada pela força
e pela angústia
Que a verdade da vida sempre pede
E que interminavelmente tens que dar!...

Adalgisa Nery

De A Mulher Ausente (1940)



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